domingo, fevereiro 25, 2007

lugar do telheiro



até aos 23 anos vivi em casa dos meus pais, no lugar do telheiro, freguesia de s. mamede de infesta, concelho de matosinhos. mais precisamente na Rua de S. António do Telheiro (o santo terá um dia pernoitado junto à capela, tendo-se erguido um telheiro para o abrigar).

este lugar fica a poente da estrada que vai do cruzamento do amial (estrada da circunvalação, perto do hospital s. joao) até ao centro de s. mamede (vira-se na padaria santo antonio), "encravado" entre a cinzenta e equestre fábrica de curtumes Monteiro Ribas (onde o meu pai trabalhou durante muitos anos) e a linha de comboio que vem do porto de leixoes (com a bela estação de S. Mamede, que atravessava a correr para nao ser apanhado pelo guarda - é uma linha apenas de transporte de mercadorias...).

quando os meus pais se mudaram para lá era ainda um lugar rural, com quintas, campos e vacas a pastar, o ribeiro de picoutos onde em tempos se lavava roupa e que provocava grandes inundações (já o conheci imensamente poluido mas ainda com margens vivas onde construia os meus telheiros e sonhava com jangadas), capela e grandes festas populares em honra do santantoninho (na primeira semana de setembro, atraindo multidoes, com decorações na rua, capela toda iluminada, procissao... muito fogo de artificio, preso e celeste, dançaricos no meio da rua, carrosseis e carrinhos de choque, leiloes e matraquilhos, farturas e bifanas...), a escola primária que frequentei da 1ª à 4ª classe (assim como os meus irmaos), o aviario dos vizinhos, o mini-mercado, a pastelaria...

ao fundo da rua existia aquilo a que chamavamos simplesmente a "ilha", onde viviam os mais pobres, em pequenas casas amalgamadas, gente rude que de tempos a tempos gerava grandes discussoes... ter um problema com um deles era ter um problema com todos... por isso e por nunca se prever o que podia acontecer, sempre que passava por lá era um pouco a medo... mas simultaneamente sentia-me atraido por toda aquela vida comunitaria, colorida e animada, de roupas e velhos a apanhar sol e de musica, crianças e mulheres aos gritos...

hoje em dia (quase) tudo está mudado. s. mamede é agora uma cidade, o ribeiro foi encanado e a vegetação das margens arrasada (esta destruição da paisagem do meu quarto despoletou a minha consciencia ambientalista), a ilha ja nao existe (os moradores estarao provavelmente algures num bairro social), apesar dos muitos predios construidos a escola ficou com poucos alunos e, depois de exemplarmente recuperada, acabou por fechar (fenomeno que me deixa perplexo)... os campos estao encolhidos, quase todos abandonados e com varias ocupações "clandestinas", incluindo uma oficina de escapes nas traseiras da minha casa... as festas populares estao asfixiadas...

um dia os campos a nascente e/ou poente da rua de santo antonio serao transformados num grande espaço verde...

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