sexta-feira, outubro 13, 2006
Para a História da Reserva Ornitológica do Mindelo
Caros Amigos
Para a História da Reserva Ornitológica do Mindelo envio, em anexo, a transcrição do Diário da Assembleia da República com uma intervenção que, a propósito, tive oportunidade de fazer, na IV Legislatura - 1986. na mesma ocasião, e em ocasiões posteriores, fiz requerimentos ao Governo (era Primeiro Ministro o Prof. Cavaco Silva), tentei tudo para obter respostas.
Silêncio sinistro e profundo !!! (passaram-se 20 anos...)
Saudações Cordiais
António Sousa Pereira
ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA IV LEGISLATURA
25 DE OUTUBRO DE 1986
Do Diário da Assembleia da República
"Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.
O Sr. Sousa Pereira (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Reserva Ornitológica do Mindelo (Vila do Conde) está ameaçada.
Uma resolução da câmara municipal aprovou um projecto de urbanização da zona de dunas da reserva, integrando um total de cerca de 1500 habitações, o que corresponde, grosso modo, a uma pressão da ordem de 6000 pessoas. O projecto é constituído por duas partes separadas por uma faixa integrante da Ribeira de Silvares, com cerca de 450 m de largura, que seria o espaço residual da reserva. Ora, tal projecto, em termos práticos, inviabiliza pura e simplesmente a reserva.
Um núcleo populacional tão grande exige acessos e diversos complementos de ordem social, cuja construção acabará, num futuro próximo, por destruir ecologicamente toda a zona. E, então, justificar-se-á a urbanização da faixa agora deixada «íntegra», que não terá mais razão de existir.
Contrariamente a afirmações tornadas públicas, não decresceu o papel de zona privilegiada para aves migrantes e sedentárias, e a confirmá-lo está o facto de, nos últimos anos, ter aumentado significativamente o número de espécies observadas. Citei o Prof. Joaquim Santos Júnior, Prof. da Universidade do Porto e presidente da Sociedade Portuguesa de Ornitologia.
Esta grave situação, que encontra antecendentes em autorizações, por parte da Câmara Municipal de Vila do Conde, para loteamentos no local e mesmo na construção de uma fábrica de produtos químicos, à revelia da oposição da Junta de Freguesia do Mindelo, que em devido tempo alertou as entidades competentes para o que se passava, é tratada pela câmara local no maior desprezo pela conservação do património natural e do equilíbrio ecológico da zona, permitindo adivinhar que há outros interesses em jogo. Não deixa de ser significativa a afirmação do seu presidente, aliás concordante com a opinião da empresa interessada, como adiante veremos na reunião da Assembleia Municipal de 8 de Maio deste ano, quando disse:
”Quanto à Reserva Ornitológica de Silvares-Mindelo, aquilo já é um mito. Só porque um dia passaram por lá uns passarinhos!...”
Será que isto resulta de, volto a citar, «uma gestão dinâmica e impaciente, na resolução de problemas das populações que implica o não cumprimento de algumas disposições legais pelo desconhecimento e em grande medida pela insensibilidade do Executivo para a observância dos mesmos»? - citei o inspector de finanças, Alfredo Manuel S. Silva, no seu relatório de uma recente inspecção à Câmara Municipal de Vila do Conde.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A preocupação manifestada sobre esta matéria por parte de várias entidades levou o Sr. Secretário de Estado do Ambiente a despachar o seguinte em 22 de Junho de 1986:
Ao confirmarem-se as afirmações expressas por estas três entidades que me abordaram pessoalmente em deslocação recente a Vila do Conde, estaríamos perante um grave atentado aos valores naturais que a Reserva, criada em 1959, procura reservar.
No entanto, até ao momento, nada mais se sabe sobre o assunto, desconhecendo-se que mais provas são necessárias para atestar o inequívoco valor da Reserva, conhecida até internacionalmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É urgente impedir mais atentados contra o património natural português cometidos, hipocritamente, em nome da crise que atravessa a construção civil, como é o caso.
A este propósito é espantosa a seguinte passagem de um requerimento da sociedade interessada no empreendimento, quando recorreu de um primeiro indeferimento da Direcção-Geral do Planeamento Urbanístico para o loteamento no local da Reserva Ornitológica. Indeferimento esse que, baseado justamente na existência da Reserva, passo a citar:
A delimitação da Reserva Ornitológica não é, na letra do diploma, impeditiva da construção -e cremos que na área foram já aprovados loteamentos -, impondo assim cuidados para não prejudicar presumíveis espécies; como as espécies que levaram à delimitação já se não encontram há muito e as restantes medidas previstas no diploma não foram tomadas pela Administração, a evocação do decreto da Reserva constitui uma manifestação de zelo, no mínimo extemporânea quanto ao seu espírito e excessiva quanto à sua letra, não se justificando, portanto, para viabilizar este empreendimento, a prévia declaração de nulo valor da Reserva em questão mas sim e apenas a sua interpretação com ânimo realista.
Não é menos espantoso o facto de a Direcção-Geral de Planeamento Urbanístico, em Julho de 1985, ter viabilizado o projecto, que, embora com arranjos, continua a ter os mesmos efeitos práticos - a destruição da Reserva. E aqui seria bom saber-se que influências se moveram e como. Eis, pois, um conjunto de questões que se colocam ao Governo e para as quais se esperam respostas e resoluções urgentes."
...............
Observações:
Fernando Gomes, ex-presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde (1974-1981) e do Porto, foi Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo no IX Governo Constitucional (1983-1985), tendo como Ministro Carlos Melancia, conhecido pelo "fax de macau", e Mário Soares como Primeiro-Ministro
Carlos Pimenta foi Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais no X Governo Constitucional (1985-1987), tendo como ministro Luís Valente de Oliveira e Cavaco Silva como Primeiro-Ministro
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